(Foto: Programa Paratodos)

“Fundação da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino completa 100 anos”, por Isabel Conte

A Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) foi fundada em 9 de agosto de 1922, no Rio de Janeiro, sob a denominação Federação Brasileira das Ligas pelo Progresso Feminino, um movimento de âmbito nacional com o objetivo de defender os direitos da mulher brasileira.

O seu estatuto explicitava seu objetivo da seguinte forma: “Coordenar e orientar os esforços da mulher no sentido de elevar-lhe o nível da cultura e tornar-lhe mais eficiente à atividade social, quer na vida doméstica, quer na vida pública, intelectual e política”.

A Federação não tinha vinculação partidária, tendo sido classificada como associação de utilidade pública em 5 de agosto de 1924. Compuseram a primeira diretoria Berta Lutz, Jerônima Mesquita, Stela Guerra Duval, Carmem Portinho e Maria Amália Bastos.

Apesar de ter pretendido alcançar todo o universo feminino no Brasil, a FBPF, desde o seu início, foi dirigida por mulheres oriundas das classes altas. Além de Bertha Lutz (1894-1976), que presidiu a entidade até seu encerramento, em 1937, fizeram parte da diretoria durante os anos 1930, por exemplo, as seguintes mulheres:

  • Jerônima Mesquita (1880-1972), filha da baronesa do Bonfim, que estudou na França e participou da entidade Damas da Cruz Verde, além de ter sido uma das fundadoras da Maternidade Pró-Matre e da Federação das Bandeirantes do Brasil;
  • Maria Eugênia Celso Carneiro de Mendonça, filha do conde de Afonso Celso e neta do visconde de Ouro Preto, jornalista que estudou no Colégio Sion e integrou a Damas da Cruz Verde, sendo também uma das fundadoras da Pró-Matre;
  • Carmen Velasco Portinho, engenheira responsável por obras tais como o Conjunto Habitacional do Pedregulho e o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, além de ter criado e dirigido, por 20 anos, a Escola de Desenho Industrial (ESDI);
  • Maria Luiza Bittencourt, advogada e uma das redatoras do Estatuto da Mulher;
  • Orminda Bastos, advogada, jornalista, professora e uma das fundadoras da União Universitária Brasileira.

A FBPF se aproveitava da inserção e do prestígio social dessas mulheres e das sócias mais atuantes para alcançar seus objetivos através do estreitamento das relações com os poderes estabelecidos. Tratava-se de negociar e se aliar a tais poderes, ao invés de contestá-los. Esta atitude, que pode ser interpretada como conservadora, na verdade facilitou conquistas feministas, como o voto feminino.

Fruto direto do intenso movimento pró-sufrágio feminino, desencadeado internacionalmente a partir do final do século XIX, e de toda uma contestação à ordem política e institucional da República Velha, a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF) teve sua atuação marcada basicamente pela luta em prol do voto da mulher no Brasil.

Em seus primeiros anos de existência, a FBPF mostrou-se bastante ativa no encaminhamento do movimento sufragista, organizando, ainda em 18 de novembro de 1922, a I Conferência pelo Progresso Feminino, visando discutir o voto e as condições de trabalho da mulher. A mesa diretora do encontro era integrada pela diretoria da federação e por três políticos favoráveis ao voto feminino: o vice-presidente da República, Estácio Coimbra, e os senadores Lopes Gonçalves e Lauro Müller.

A discussão sobre o voto feminino teve ampla repercussão na imprensa e em algumas entidades, como o Instituto dos Advogados Brasileiros, que chegou a aprovar uma moção favorável à causa. A partir desse congresso, a campanha sufragista ganhou força na sociedade, não conseguindo, porém, constituir um grupo de pressão sobre o Legislativo, em sua maioria contrário ao voto da mulher.

A primeira vitória da campanha sufragista movida pela FBPF ocorreu em 1927, quando o governo do estado do Rio Grande do Norte fez inserir um artigo na constituição estadual suprimindo as barreiras ao voto feminino. A despeito dessa medida, os votos das mulheres foram considerados nulos pelo Tribunal Eleitoral do estado. Em lugar de arrefecer a campanha, esse episódio fortaleceu-a. Em todo o país, várias mulheres entraram com pedido de alistamento eleitoral

No final da década de 1920, a Federação pelo Progresso Feminino reunia várias associações profissionais de mulheres e possuía núcleos em vários estados. Entre estes, destacavam-se os da Bahia (dirigido por Maria Luísa Bittencourt), de Minas (Elvira Kommel), de Pernambuco (Nícia Sá Pereira), de Sergipe (Maria Rita) e de Alagoas (Lili Lages).

Em julho de 1931, a federação promoveu seu segundo congresso, durante o qual se tratou principalmente de questões trabalhistas: férias, equiparação de salários, etc. A comissão organizadora do encontro era composta por Sílvia de Melo Macedo, Anne Borges Ferreira e Alice Pinheiro Coimbra.

A conquista definitiva do direito da mulher ao voto, reconhecido pelo código eleitoral de 1932, marcou o início do gradual esvaziamento da federação. Com a decretação do Estado Novo em 1937, a Federação teve suas atividades e seu prestígio político enfraquecidos. A entidade continuou a existir, contudo, tendo sido fechada apenas em 1986.

Para alcançar seus objetivos, as feministas da Federação tinham que enfrentar um duplo desafio: de um lado, estruturar uma entidade de caráter nacional, que almejava ocupar o lugar central de porta-voz das questões feministas no país, e que fosse reconhecida como tal pelas autoridades competentes, possuindo uma estratégia clara, eficiente e efetiva de ter abraçada cada uma de suas reivindicações; do outro, legitimar-se com a sua base de sustentação – as mulheres –, incentivando-as a participar do movimento.

A conquista do direito feminino ao sufrágio – primeiro com o Código Eleitoral de 1932 e, finalmente, com a Carta Constitucional de 1934 –, a aprovação de mulheres em cargos públicos de relevância e a eleição de Bertha Lutz como deputada constituinte são exemplos da eficácia dos meios adotados pela FBPF para a consecução de seus objetivos. Várias mulheres, algumas delas membras da Federação, foram eleitas constituintes estaduais. A atuação da FBPF – conservadora para alguns, libertária para outros – foi inovadora ao permitir que os anseios femininos ultrapassassem a esfera privada e desembocassem na esfera pública.

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