(Foto: Reprodução/Maurício Tagliavini)

Capela do seminário de Botucatu vira tema de artigo acadêmico

A Capela da Santíssima Trindade, localizada no antigo seminário da Arquidiocese de Botucatu, foi tema de um artigo acadêmico que resgata a história que envolve a igreja. O texto “A Capela da Santíssima Trindade de Botucatu como patrimônio cultural de valor histórico, artístico e arquitetônico” foi apresentado como o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) da pós-graduação da engenheira Julia Carolina Athanázio Heliodoro em Patrimônio Histórico-Cultural.

O artigo foi publicado pela Revista Contemporânea e considera a capela como um importante patrimônio histórico nacional. Em entrevista ao Jornal Audácia, a autora relembrou as razões pelas quais se dedicou a estudar a história da capela.

“Apesar de eu ter estudado engenharia florestal, eu sempre gostei muito de arte, cultura, patrimônio histórico, tenho até uma pós-graduação na área. Quando eu era adolescente, pelos meus treze ou catorze anos, minha mãe foi da equipe que colaborou na angariação de fundos e na busca por profissionais especializados para a restauração do mural da capela. Eu ia em todas as reuniões com ela, participava e ouvia muito sobre a história, então eu tenho um carinho especial pela capela”, lembra.

A Capela da Santíssima Trindade pertence ao Seminário São José de Botucatu e foi encomendada pelo então bispo diocesano Dom Henrique Golland Trindade, em 1951, para uso exclusivo de seus seminaristas. Com uma arquitetura semelhante às das primeiras igrejas cristãs, a capela foi construída toda em tijolos aparentes, em uma depressão no terreno do então seminário. Aos fundos, foi construída uma sacristia com altar dedicado ao Papa São Pio X, responsável pela criação do Bispado de Botucatu.

Além do projeto arquitetado pelo renomado Benedito Calixto de Jesus Neto, à mesma época em que acompanhava as obras da construção da Basílica de Aparecida, a capela de Botucatu também possui preciosidades como a imagem do Menino Jesus de Praga proveniente da Espanha e as imagens de São José e Nossa Senhora de Fátima esculpidas em madeira no norte da Itália.

O maior destaque artístico, porém, é a pintura mural feita por Henrique Carlos Bicalho Oswald – mais tarde soube-se que também por sua esposa Jacyra C. Oswald – em óleo concentrado sobre alvenaria. Segundo a arquiteta Maria Amélia Blasi de Toledo Piza, a obra é marcada por seu estilo bizantino, como o simbolismo, a representação plana e frontal, a altura excessiva das figuras, que são predominantemente morenas e posicionadas em grupos e o fundo em dourado, sem paisagens. No entanto, algumas características românicas, mesmo estilo da construção arquitetônica, também aparecem, como a superposição das figuras e a demonstração de hierarquia nas suas proporções.

Cartão postal fotográfico da capela da Santíssima Trindade (Foto: Reprodução/Alberto Lopes)

Cada detalhe de sua execução foi acompanhado por seu encomendador, o bispo Dom Henrique, que tinha na obra claras intenções didáticas para formação de seus seminaristas – os únicos visitantes da Capela nos seus primeiros anos. Enquanto o anteprojeto continha apenas trinta figuras, o trabalho totalizou 55 ao seu término, com santos sendo incluídos a pedido do bispo.

O grau de complexidade e detalhamento aumentou, e cada personagem possui uma identificação e característica representada após pesquisa conjunta entre o artista e o bispo. Em função das expectativas de D. Henrique, o Pai Eterno, antes representado apenas pela mão, aparece no mural de corpo inteiro e o Cristo e Maria, antes em meio-corpo aparecem também por inteiro.

A participação de Dom Henrique foi fundamental para a beleza e representatividade arquitetônica, artística e religiosa do local. Ele foi responsável pela contratação dos artistas, acompanhamento das obras e a escolha do tema do afresco, em coerência aos princípios litúrgicos e às recentes diretrizes da Igreja. Segundo Piza, o então bispo de Botucatu participou da reunião em Roma que formalizou a Renovação Litúrgica conduzida pelo Papa Pio XII e, na ocasião, visitou igrejas paleocristãs do tipo basilical na Itália, estilo adotado pelo arquiteto Benedito Calixto para o projeto da capela a pedido de Dom Henrique.

Após cerca de setenta anos de inauguração, a capela reúne as características necessárias para um tombamento, segundo Julia. “A capela não tem só uma importância artística, também tem uma importância histórica e arquitetônica que se mistura com a história do município de Botucatu e a história da Igreja Católica aqui na região”.

A engenheira ainda aponta que, apesar desta região ser protegida pela legislação municipal, não há uma regulamentação que aponte as medidas a serem tomadas para a sua devida conservação. “Botucatu cita na lei que os prédios do centro histórico devem ser protegidos, mas eles não são tombados e nem normatizados, não há uma norma que fale o que pode ser feito e o que não pode. Botucatu é uma cidade muito importante culturalmente e historicamente, então acho que deveria sim ter um cuidado maior, o que não significa que não tenha algo sendo feito”.

Exemplo disso é a recente descaracterização do pátio do antigo seminário, ocorrido em meados de agosto de 2021. “Por um lado, eu fiquei triste em saber [da descaracterização], pois o pátio faz parte da vista arquitetônica que tínhamos da capela, que é um patrimônio tão importante. Apesar dela ter uma proteção patrimonial pela cidade de Botucatu, assim como a Prefeitura, a Catedral, a Embaixada Portuguesa, o colégio La Salle, o colégio Santa Marcelina, nenhum deles é realmente tombado como patrimônio histórico. Por outro lado, eu entendo que com a ausência dessa lei, esta foi a maneira encontrada para se angariar fundos para a igreja que aluga o prédio. Mas espero que, um dia, essa cobertura possa ser retirada sem prejudicar o patrimônio”, conclui a pesquisadora.

Você pode ler o artigo completo de Julia Carolina Athanázio Heliodoro por este link.

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