A cidade de Botucatu, assim como boa parte do interior paulista, recebeu muitas famílias judias com as diásporas oriundas de diversos países europeus em momentos de pós-guerra.
Uma das famílias mais conhecidas de nossa cidade é a família Levy. Seu patriarca, o judeu-francês Samuel Levy, fugindo da guerra franco-alemã em 1870, resolveu imigrar para o Brasil. Aqui viveu como ourives e dentista protético e, mais tarde, tornou-se rabino, para prestar assistência religiosa à pequena comunidade judaica dispersa pelo interior.
Possivelmente, a cidade recebera muito mais famílias judaicas que o registrado, e quase todas vindas da antiga URSS e de países que caíram sob a influência da revolução bolchevique de 1917 – ao menos era o que os brasileiros que trabalhavam com eles ouviam.
Talvez não fosse coincidência e realmente existisse um conterrâneo aqui antes: no almanaque de 1920 já existia um russo chamado Maurício Averback, que trabalhava em uma loja de móveis chamada “Casa dos Russos”. Como você perceberá a seguir, este ramo de negócios foi o que mais atraiu as levas de judeus que chegaram pouco tempo depois.
Quase todos montaram suas lojas na Rua Amando de Barros: ali estavam o russo Ramiro Glimblat, dono da loja de móveis Casa Ramiro; Marcos Zilber veio da Besarábia (nome antigo de uma região ao sul da Rússia) e era proprietário da Mobiliadora Moderna; e o polonês Bencjon Waksman, da loja de móveis Favorecedora.
Além dos móveis, as lojas de roupas feitas também foram uma área de interesse dos imigrantes. O russo José Acquerman, o francês Jacques Zumercon (dono da Casa Jacques) e, antes deles, Paulo Goldemberg e sua família (proprietários da Casa Botucatu e também trabalhavam com roupas feitas) foram alguns que apostaram nessa especialidade. É possível dizer que, entre os anos 40 e 80, a presença das famílias judaicas foi quase uma exclusividade no ramo de móveis e roupas feitas.
Nessa mesma época, existia outra pequena loja, um misto de relojoaria e joalheria, a única que trabalhava com joias na cidade – onde teria se iniciado a relojoaria do botucatuense “Dito Loco”. Era de propriedade de um israelita de nome Jacob, genro de outro comerciante, também judeu, Ramiro Glimblat.
Muitas dessas famílias, ao encerrarem suas atividades comerciais, se mudaram para cidades maiores, visto que a falta de uma sinagoga em Botucatu os atrapalhava de exercer coletivamente sua fé, sendo um dos principais motivos para a saída de muitos judeus da cidade.
Os brasileiros tinham uma relação de curiosidade, e muitas vezes achavam até esquisito, o fato dos judeus se preocuparem tanto em não comer um bom misto quente, exatamente para evitar a carne de porco do presunto. Contam que Jacques especulava por longos minutos o garçom do Café do Ponto, antes de receber o seu “bauru de carne”.
Já Zilber ficou extremamente preocupado quando seu filho, Moshe, foi estudar fora: “O que irá ele comer na república, carne de porco?”. Ainda lembram do desespero de algumas mães judias ao perceberem que seus filhos, sempre em contato com crianças cristãs, se encantavam com as árvores de Natal e queriam armá-las dentro de suas casas.
Fugindo de uma realidade cruel em seus países de origem, os judeus encontraram em Botucatu uma ilha de paz frente aos horrores da guerra. Aqui fixaram residência e, apostando no comércio, foram um dos atores mais importantes no desenvolvimento econômico de Botucatu.
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Que história interessante!
Muito legal saber dessa participação no comércio de Botucatu.